O MEDO QUE A ELITE TEM DO POVO É MOSTRADO AQUI

A Universidade de Coimbra justificou da seguinte maneira o título de Doutor Honoris Causa ao cidadão Lula da Silva: “a política transporta positividade e com positividade deve ser exercida. Da poesia para o filósofo, do filósofo para o povo. Do povo para o homem do povo: Lula da Silva”

Clique na imagem abaixo e conheça o "Quem tem medo da democracia?" - sucessor deste blog

Clique na imagem abaixo e conheça o "Quem tem medo da democracia?" - sucessor deste blog
Peço que, quem queira continuar acompanhando o meu trabalho, siga o novo blog.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Sobre pirotecnias, corrupção e lamentos


Tivesse segurado a ânsia de dar um “furo” que não tinha, tivesse conseguido uma entrevista com Lula ou esperado para ouvir a entrevista que uma rádio de Goiás conseguiu no exato dia da publicação do jornal, teria ouvido dele um belo – e paradoxal – título para sua matéria: “Prisão de Arruda deve ser exemplo contra corrupção.”


Por Ana Helena Tavares (para o "Observatório da Imprensa")

Nos últimos tempos, de uma grande imprensa com credibilidade em queda livre, o Jornal do Brasil tem sido um oásis. Em meio a tantos veículos de comunicação exercendo, em regra, o desserviço da desinformação tendenciosa, de maneiras as mais sujas possíveis, é bom que se registre esse fator positivo. O JB tem sido um jornal onde se pode encontrar uma pluralidade de idéias exemplar e pouco vista entre os concorrentes de seu porte, tanto a nível estadual (Rio de Janeiro) como a nível nacional. Dito isso, sinto-me à vontade para lembrar, porém, que a perfeição não existe. E na sexta-feira, 12 de Fevereiro, o JB deu um escorregão lamentável que, no seu caso, chama a atenção justamente pelo fato de constituir uma exceção à regra.


Na editoria “País”, página A6, um jornalista sério, com os dados escassos de que dispunha, jamais faria uma matéria com o seguinte título: “Governador se entrega à PF e Lula lamenta a prisão”. Quem lê a matéria inteira encontra, só e somente só no penúltimo parágrafo, as seguintes suposições, sim suposições, sobre o pensamento de Lula a respeito do caso: “Um assessor próximo ao presidente Luís Inácio Lula da Silva disse ontem que o presidente ficou “abatido” com a prisão de Arruda. Lula teria lamentado o episódio dizendo que isso “não era bom para o Brasil nem para a política”. O presidente também teria recomendado ao novo ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que a Polícia Federal tomasse cuidado com a exposição da imagem do governador”. Vai daí que, nas palavras de um inominado “assessor próximo”, e no “teria lamentado o episódio” parou o trabalho de apuração do repórter. Por que então afirmar no título que Lula lamentou a prisão?


As palavras têm um poder manipulador imensurável – e jornalistas sabem disso. Boa parte dos leitores de jornais só lê os títulos – jornalistas também sabem disso. E é exatamente a imagem de um presidente corrupto que aquele título faz saltar aos olhos. Afinal, quem lamentaria a prisão de um político corrupto senão quem se considera igual ao preso? Não é preciso nenhum vasto conhecimento de mundo para que se saiba que lamentar a prisão de alguém é algo deveras diferente de se lamentar o episódio que levou à prisão. Parece claro que todo cidadão consciente, aquele que luta por um país mais justo, lamenta a corrupção, episódio que levou à prisão de Arruda. Já lamentar a prisão é coisa que fica a cargo de quem concorda com o método dele, quem teme ser também pego em flagrante por atos parecidos, quem tinha a certeza da impunidade e já não a tem, quem crê que não há mal algum em se levar vantagem em tudo.


O problema é que em nenhum momento Lula disse lamentar a prisão de Arruda. O título é mentiroso e sensacionalista, prefiro crer que nascido da simples ânsia de chamar a atenção para o texto. Tivesse escrito tão somente “Governador se entrega à PF” teria sido verdadeiro, mas quantos se interessariam em ler mais um dentre tantos textos sobre o mesmo assunto? Tivesse segurado a ânsia de dar um “furo” que não tinha, tivesse conseguido uma entrevista com Lula ou esperado para ouvir (*) a entrevista que uma rádio de Goiás conseguiu no exato dia da publicação do jornal, teria ouvido dele um belo – e paradoxal – título para sua matéria: “Prisão de Arruda deve ser exemplo contra corrupção.”


E teria ouvido mais: “Obviamente que eu fico chocado quando eu vejo as denúncias de corrupção nesse país, fiquei chocado quando apareceu aquele filme do Arruda recebendo dinheiro, é uma coisa absurda a gente imaginar que no século XXI isso acontece no Brasil. Agora, a prisão foi decretada pelo poder Judiciário. Ou seja, de 15 juízes, 12 ou 13 votaram pela prisão dele. O que a Polícia Federal fez foi aceitar um pedido do próprio Arruda que pediu para se entregar sem precisar sair de casa algemado. Ou seja, como também a polícia Federal não está mais disposta a fazer pirotecnia com mais ninguém, foi uma atitude correta.”


Ou seja (como costuma dizer o próprio Lula), o que o presidente lamentou e quem fez pirotecnia?


É melhor acreditar que foi só pirotecnia, porque o JB ainda merece meu voto de confiança e não conheço o jornalista que escreveu a matéria. Então, como não costumo jogar sem dados, prefiro crer que ele não se inclui na já vasta lista de jornalistas corruptos que não se contentam em ser corruptos sozinhos. Precisam cravar nos governantes a imagem da corrupção. Seu Eldorado é derrubar um presidente que tem a popularidade que eles lamentam não ter.


Ana Helena Tavares é escritora e poeta eternamente aprendiz. Jornalista por paixão e futura jornalista com diploma, é colunista da “Revista Médio Paraíba”, colaboradora do "Observatório da Imprensa" e editora/administradora do blog “Quem tem medo do Lula?”.


(*) Clique aqui para ouvir.

Uai! "Isso aqui não é a Venezuela!"


Uai! "Isso aqui não é a Venezuela!"




Por Laerte Braga

Alberto Fraga, secretário de Transportes do governador José Roberto Arruda, é o encarregado de organizar e direcionar a propina paga pelas empresas de transportes da capital. O percentual de cada um, o do governador é maior lógico, o ponto e o dia de entrega, o horário, essas coisas que acontecem em governos tucanos, DEM, PPS e partidos paralelos, digamos assim.


O secretário foi visitar o governador nas dependências da Polícia Federal, onde Arruda se encontra em retiro forçado, naturalmente para orar e agradecer a propina de cada dia e, evidente, saber do chefe como deve continuar a ser operado o “sistema” de propina.


Neste momento todo cuidado é pouco e qualquer deslize só vai fazer aumentar o bloco do retiro na Polícia Federal. Fraga, certamente, não quer ser um deles e deve ter recebido instruções sobre como apagar pistas.


À saída, tentando descaracterizar a prisão de Arruda como sendo a prisão de um bandido, um assaltante de cofres públicos, disse aos jornalistas que a idéia de intervenção em Brasília é “ridícula” e que “eles estão pensando que isso aqui é a Venezuela”.


Uai! Confesso que, levando em conta o noticiário de todos os dias sobre o presidente Chávez, os fatos que “acontecem” na vizinha nação (na ótica enfurecida de Miriam Leitão, Lúcia Hipólito, etc), não entendi o que o secretário/bandido quis dizer.


Que na Venezuela bandidos como Arruda, Serra, Yeda Crusius, FHC são presos e aqui isso seria uma arbitrariedade?


Só pode. A julgar pelo tom “patriótico” do secretário/canalha não dá para interpretar suas declarações de outra forma.


“Isso aqui não é a Venezuela”. É o que então na cabeça do assaltante de cofres públicos? A casa da mãe Joana?


Um dos argumentos desse tipo de gente é tentar confundir os fatos e levar a opinião a acreditar que mafiosos como Arruda são vítimas de perseguição política e não passam de cândidos inocentes que quando recebem as gorjetas, digamos assim, de empreiteiros, banqueiros, grandes empresários, latifundiários, agradecem a Deus a possibilidade de terem os seus futuros assegurados, garantidos, o leite das crianças.


Transformam criminosos como Arruda e ele próprio Alberto Fraga em “presos políticos”.


A intervenção em Brasília foi pedida pela Procuradoria Geral da República uma instituição autônoma, independente do presidente da República, que designa o Procurador a partir de uma lista tríplice formada pelo conjunto de procuradores, OAB e outros. Não foi o governo Lula que pediu a intervenção.


O pedido foi feito e encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), Poder Judiciário, portanto, nada a ver com Lula e a hipótese, em primeiro momento, foi levantada no próprio tribunal levando em conta a corrupção generalizada na Assembléia Distrital de Brasília, onde Arruda tem maioria (DEM, PSDB, PPS e acessórios).


É uma decisão difícil, última, só tomada em casos extremos (o risco Joaquim Roriz de volta cria o caso extremo). A propósito, Roriz tinha um irmão bispo que só não vendeu a catedral da cidade mineira de Juiz de Fora porque a opinião pública reagiu, no mais vendeu o que pode e embolsou tudo.


O fato do governador Paulo Otávio estar envolvido em corrupção e no esquema Arruda é outro indicativo ao qual se soma a corrupção que permeia a Assembléia Distrital. Vai sobrar o que?


Paulo Otávio, em matéria de corrupção, é anterior a Arruda, a Roriz e é um dos “donos” de Brasília.


O que poucos perceberam nessa sujeirada é que quem trouxe a público toda a bandalheira do governo Arruda foi um ex-secretário de Roriz. Fácil de entender. O dito foi contatado pela máfia rival, a de Roriz, os velhos tempos foram lembrados, o ano eleitoral e Roriz quer voltar a ser governador, um acordo aqui, outro ali, um dinheirinho aqui, outro dinheirão ali e pronto. Como naqueles filmes de gangster que o cara abraça o outro e quando o outro liga o carro...


Buuuuum!


“Não é nada pessoal, são só negócios”.


Só que nesse caso os “negócios” dizem respeito à capital do País e envolvem figuras que se preparavam para disputar as eleições deste ano na tentativa de recuperar a presidência da República, através do poderoso chefão José Collor Serra. O tal que queria Arruda como vice.


Um primor de cretinice e canalhice a declaração do secretário de Propinas, quer dizer, Transportes, sobre “isso aqui não é a Venezuela”.


Acho que nesse e noutros casos então devemos ser a Venezuela correndo, antes que esses caras acabem com o País e inventem modos “patrióticos” de guardar dinheiro na meia, na cueca, em pastas, terminando tudo numa oração de agradecimento.


Os casos de corrupção da governadora do Rio Grande do Sul são tão graves e vergonhosos como os de José Roberto Arruda. Como o disse o ministro Marco Aurélio Mello em sua decisão, “estamos inaugurando uma nova era...”, saindo inclusive da saia justa que Gilmar Mendes criou, tentando atirá-lo num buraco chamado habeas corpus.


Que se prossiga a nova era. Yeda na cadeia. Serra na cadeia. FHC por ter vendido o País na cadeia. Kátia Abreu e mais da metade do Senado na cadeia. Mais da metade da Câmara Federal na cadeia. Boa parte do Judiciário, inclusive Gilmar Mendes na cadeia. E haja cadeia.


Desde o primeiro momento a comentarista Lúcia Hipólito (a que de tão bêbada não conseguiu articular uma palavra quando chamada a comentar sobre os direitos humanos num programa de uma rádio da REDE GLOBO) está tentando implicar o presidente da República nessa história toda. Tentando dar um viés eleitoral à prisão de Arruda.


Só que Lula não prendeu ninguém, quem pediu a prisão foi a OAB e quem prendeu, determinou a prisão, foi o STJ. Quem negou o habeas corpus foi um ministro do STF.


Aí vem o secretário dos Transportes, propineiro, corrupto, venal e afirma que “isso aqui não é a Venezuela”.


Se a Venezuela for o oposto do secretário, e é, que isso aqui seja a Venezuela correndo.


A continuar nessa toada daqui a pouco vai ter gente acendendo vela para que o “mártir” Arruda seja solto em nome da democracia cristã, ocidental e o presidente da CNBB vai recebê-lo à porta da Polícia Federal. É o tal que não gosta que falem mal de corruptos e retirou das bancas um jornal que apontava irregularidades (corrupção mesmo) no governo de Aécio Pirlimpim Neves.


Laerte Braga é jornalista e colaborador do blog "Quem tem medo do Lula?"

Para não dizer que não falamos de Carnaval 2: Festa da igualdade, da loucura e do prazer











Festa da igualdade, da loucura e do prazer

"A Estação Primeira de Mangueira
passa em ruas largas

Passa por debaixo da
avenida Presidente Vargas"

(Caetano Veloso, "Enquanto o Lobo
Não Vem"
, 1968 - a imagem é de 1967)




Por Celso Lungaretti


A origem do carnaval perde-se na poeira dos tempos. Há quem tente remontá-la ao culto agrário praticado por povos que existiram 10 mil anos antes de Cristo: homens e mulheres mascarados, com corpos pintados e cobertos de peles ou plumas, saíam em bandos e invadiam as casas, fazendo terríveis algazarras.


Outros autores lembram as festas alegres do paganismo, como a de Ísis e a do Boi Ápis, entre os egípcios, e as bacanais, lupercais e saturnais dos romanos.




Suetônio, historiador da Roma antiga, refere-se às saturnais como “desenfreada libertinagem, cínica palhaçada”. E diz que, durante esse período “todos pareciam enlouquecer”. Armavam-se grandes mesas à frente das casas para senhores e escravos comerem à vontade, sem distinções. E os escravos tinham o direito de dizer verdades a seus donos, ridicularizá-los, fazer o que quisessem.




A componente libidinosa do carnaval é inegável em todos os textos antigos. Sabe-se, p. ex., que o termo carnaval deriva do latim carrum novalis, deignação de um tipo de carro alegórico da Grécia e Roma antigas. Dezenas de pessoas mascaradas caminhavam a seu lado e ele trazia no bojo “mulheres nuas e homens que cantavam canções impudicas”.




A Idade Média, com a rígida tutela religiosa sobre a vida social, não poderia trazer acréscimos significativos ao carnaval. Mas, pelo menos, não conseguiu extinguir esses festejos, que continuaram existindo como um contraponto à monótona existência dos feudos.




Contam alguns textos, inclusive, que os padres, depois de pregarem em vão contra o carnaval, acabavam convidando os fiéis a concentrarem as comemorações na praça da igreja, para que tal logradouro não ficasse desvalorizado....




A Renascença viria libertar os europeus da sensação de culpa que a religião procurava insistentemente associar ao prazer e à alegria. Os distantes e etéreos paraísos prometidos nos púlpitos, bem como as dantescas descrições do inferno que esperava os pecadores, tornaram-se insuficientes para afastar o povo da folia. A grande festa pagã renascia em todo o seu esplendor.




O medonho entrudo português – Para nós interessa, sobretudo, o carnaval português, conhecido como entrudo. Até fins do século 19, o nosso carnaval teria as mesmas características do “medonho entrudo português, porco e brutal”, a que se refere uma historiadora, assim descrevendo-o: “pelas ruas de Lisboa, generalizava-se uma verdadeira luta em que as armas eram os ovos de gema, ou suas cascas contendo farinha ou gesso, cartuchos de pó de goma, cabaças de cera com águas de cheiro, tremoços, tubos de vidro ou de cartão para soprar com violência, milho e feijão que se despejam aos alqueires sobre as cabeças dos transeuntes...”




A pesquisadora Eneida, em sua História do Carnaval Carioca, relaciona diversos casos para comprovar que, a exemplo do que ocorria na Roma de Suetônio, o carnaval aqui também se constituía no único período em que os escravos desfrutavam de uma certa liberdade. E conclui: “Parece que uma das características do carnaval é dar aos escravos de qualquer época o direito de criticar e zombar de seus senhores”.




Os limites da democracia, entretanto, sempre foram muito exíguos no Brasil, então houve também medidas caracteristicamente discricionárias. Em 1857, o chefe de polícia do Rio de Janeiro lançou um edital proibindo “o jogo do entrudo dentro do município. Qualquer pessoa que o jogar incorrerá na pena de 4$ a 12$ e não tendo com que satisfazer, sofrerá oito dias de cadeia, caso o seu senhor não o mande castigar no calabouço com cem açoites”. Ou seja, multa para os brancos proprietários, xilindró e chicotadas para os escravos. A relatividade vem de longe...




A agressividade igualmente se evidencia em todos os textos da época. Sabe-se, p. ex., que o único objeto de divertimento do carnaval brasileiro era o limão de cheiro, uma imitação de laranja, com invólucro de cera e água fétida por dentro.




O pintor e engenheiro Jean-Baptiste Debret, que aqui veio com a Missão Artística Francesa em 1818, ficou estarrecido com a selvageria explícita: “Vi jovens negociantes ingleses passearem, com orgulho e arrogância, acompanhados por um negro vendedor de limões cujo tabuleiro esvaziavam pouco a pouco, jogando os limões às ventas de pessoas que nem sequer conheciam”.




Episódios deste tipo o marcaram tanto que um de seus desenhos mais famosos, Cena de Carnaval, mostra uma negra atacada na rua por um crioulo de cartola, que lhe esfrega no rosto um bocado de goma, enquanto o outro negro ensopa o primeiro com água de uma longa seringa.




Apenas no final daquele século a agressividade foi se atenuando e as bisnagas passaram a conter, ao invés de água suja, líquidos menos repugnantes, como vinagre, groselha e vinho; idem os limões de cheiro, cujas águas fétidas e até urina foram trocadas por inofensivos perfumes.




Zé Pereira! Bum, bum, bum! – O personagem mais característico do carnaval brasileiro surgiu em meados do século 19 e logo se tornou uma instituição popular. Trata-se do Zé Pereira, calcado na figura do sapateiro José Nogueira de Azevedo Pereira.




Português de nascimento, ele um dia entretinha-se com outros patrícios, recordando as romarias, estúrdias e estrondos da pátria distante. A saudade era tanta que eles resolveram sair à rua, ao som de zabumbas e tambores alugados às pressas, para fazer uma passeata pela cidade.




Foi um enorme sucesso, logo copiado por dezenas de grupos semelhantes, fazendo com que o Zé Pereira se transformasse num personagem mística, identificado com o próprio carnaval (“E viva o Zé Pereira/ Pois que a ninguém faz mal/ E viva a bebedeira/ Nos dias de carnaval”).




Para a historiadora Eneida, o Zé Pereira “foi essencialmente o carnaval do pobre. Tão fácil, no meio da miséria reinante, sair à rua com bumbos e tambores, uma camisa qualquer, uma calça de qualquer espécie e fazer barulho, alegrar com um ritmo efusivo as ruas e os bairros!”.




Seu desaparecimento, no começo do século passado, é indício de que o carnaval perdia espontaneidade, tornando-se festa opulenta e regulamentada, sem espaço para os improvisos populares.




Mas, a alma do Zé Pereira sobrevive nos blocos dos sujos, que insistem em se formar sem ensaios e mensalidades, para existir num momento e viver intensamente esse momento, na melhor tradição do carnaval.




Samba e umbigada – Até o início do século passado samba e carnaval tiveram trajetórias distintas, que foram convergindo no sentido de uma perfeita complementação.




O samba remonta à chegada no Brasil de escravos negros, que logo foram introduzindo seus ritmos, danças, cantigas, costumes e crenças. Assim, após o trabalho exaustivo (ou nos raros dias de folga), eles dançavam e batucavam com seus instrumentos rudes, nos terrenos das fazendas, engenhos e canaviais. Alegria sofrida, ritmo de quem esforçava-se por esquecer a tristeza, as privações e os maus tratos.




O batuque tipicamente africano foi caindo em desuso com o desaparecimento dos nativos daquele continente. Uma variação abrasileirada espalhou-se por todo o País, já com a denominação de samba. E, na zona rural, o encontro de culturas deu origem a uma derivação pitoresca, os chamados sambas sertanejos, em que homens e mulheres participavam da roda cantando em coro, ao som de instrumentos de percussão e da viola de arame.




Segundo um cronista da época, “os dançadores formam roda e, ao compasso de uma viola, move-se o dançador do centro, avança e bate com a barriga de outro da roda, uma pessoa de outro sexo. Não se pode imaginar uma dança mais lasciva do que esta, razão por que tem muitos inimigos, principalmente entre os padres”.




Lenço no pescoço – A fase heróica do samba foi a da pernada carioca, diversão a que se entregavam os remanescentes dos inúmeros grupos de capoeiristas existentes no Rio de Janeiro em fins do século 19.




Tratava-se de uma batucada braba, na base da pernada e cabeçada, regada com doses cavalares de cachaça (“Samba de negro/ Não se pode frequentá/ Só tem cachaça/ Pra gente se embriagá”).




Os conflitos eram corriqueiros e a presença da polícia, também, dando origem a verdadeiras batalhas campais, em que instrumentos musicais serviam como armas e algumas cabeças acabavam sempre rachadas (“Tava num samba/ Lá no Sarguero/ Veio a polícia/ Me jogou no tintureiro”).




O samba era tido como coisa de pretos, malandros e marginais. A posse de um violão ou qualquer outro instrumento de samba bastava como prova de que o indivíduo era vadio e merecia ser preso. E a brutalidade da polícia tinha resposta à altura por parte dos bambas. Mortes ocorriam de lado a lado.




Foi a época do tipo celebrizado por Wilson Batista, com seu andar gingado, chapéu tombado, olhar dormente, fala cheia de gírias, lenço de seda no pescoço (para proteger-se das navalhadas), camisa listrada, calças largas (boca-de-sino) ou balão (bombacha) caídas sobre os sapatos de bico fino com salto carrapeta (mais tarde, tamancos) e, evidentemente, a inseparável navalha.




Os versos do sambista da Lapa o descreve admiravelmente: “Meu chapéu de lado/ Tamanco arrastando/ Lenço no pescoço/ Navalha no bolso/ Eu passo gingando/ Provoco desafio/ Eu tenho orgulho de ser vadio”.




Trata-se de uma figura que, como o verdadeiro carnaval, sairia de cena entre as décadas de 1930 e 1940.




O Pinto e os índios – O carnaval era uma pedra no sapato dos autoritários de todos os matizes. Os chefes de polícia, desde meados do século 19, lançaram uma interminável série de editais, ora proibindo, ora regulamentando os festejos.




No carnaval carioca de 1888, entre as muitas determinações draconianas, figurava a de que, “sem a autorização do Chefe de Polícia, não podem aparecer críticas, principalmente ao Governo”.




Episódios anedóticos ocorreram aos montes. Um delegado carioca chamado Alfredo Pinto, p. ex., notabilizou-se pela perseguição aos foliões. Em 1909, tentou proibir as passeatas e o Zé Pereira, sendo obrigado a voltar atrás por causa dos protestos da população e da imprensa.




Furioso, voltou à carga proibindo as fantasias de índio, sob a alegação de que os tacapes poderiam ser utilizados como armas. Os blocos contra-atacaram com refrões provocativos que difundiram por toda a cidade, tipo “Eu vou beber/ Eu vou me embriagar/ Eu vou sair de índio/ Pra polícia me pegar”. Em outros, houve até alusões picarescas ao sobrenome do delegado...




Domesticação e turistização – Nem a polícia do terrível Filinto Müller, durante a ditadura getulista, conseguiu pôr fim aos festejos de Momo. De repente, entretanto, o povo perdeu seu carnaval, que virou um próspero negócio para as escolas de samba e foi alçado a item prioritário da promoção do turismo.




Comemorações rigorosamente planejadas substituíram as iniciativas espontâneas do povão. Os foliões se tornaram passivos espectadores dos suntuosos e multicoloridos desfiles. Sambistas passaram a competir encarniçadamente por classificações espúrias.




Enfim, a festa do congraçamento cedeu lugar à disputa calculista. O que a polícia não conseguiu com seus cassetetes, conseguiram os negociantes com seus talões de cheque.




Como explicar essa transição negativa? Dizer que, com a industrialização, fecharam-se os espaços para a desordem remanescente da sociedade rural? Que o carnaval morreu ao se institucionalizar? Que nosso povo já não tem humor nem revolta? Explicações podem ser alinhavadas às dezenas. Mas, nenhuma servirá como consolo.




O certo é que uma genuína explosão de vida se tornou ritual de repetição. E o povo se conformou em não inventar mais seus festejos nem improvisar seus itinerários, recebendo como contrapartida lugares confortáveis nas arquibancadas dos sambódromos e o direito à licenciosidade em salões sufocantes.




Enfim, foi expulso das ruas e não se dispõe mais a lutar mais por elas.




Obs: versão condensada de um texto escrito em 1980, para a edição de carnaval da revista Fiesta.












Celso Lungaretti, é jornalista, escritor e ex-preso político. Mantém o blog "Náufrago da Utopia", é autor de livro homônimo sobre sua experiência durante a ditadura militar e colaborador do blog "Quem tem medo do Lula?"

13 de Fevereiro no Brasil e no mundo


Dicionário da Sônia*


13 de fevereiro

1922 Início da semana de Arte Moderna, no Teatro Municipal de São Paulo,
até 17 de fevereiro.

1950 Einstein adverte o mundo sobre o perigo da bomba atômica.

1961 Avião norte-americano lança 20 pára-quedas na zona de Naranjo, em
Cuba, para municiar os anti-castristas de material bélico.

1971 Salvador Allende, presidente do Chile, decreta a nacionalização de
todos os recursos minerais e combustíveis do país, assinando assim a sua
sentença de morte!

1972 Morte: Lauriberto José Reys e Alexander José Ibsen Voeroes,
assassinados pela ditadura de 1964.

1991 Guerra do Golfo: Aviões dos EUA destroem um suposto esconderijo
militar em Bagdá, mas iraquianos civis denunciam que o local era apenas um
abrigo para a população.

1995 FHC sanciona a Lei de Concessões Públicas, abrindo à iniciativa
privada a exploração de serviços prestados pelo Estado como saneamento e
distribuição de energia elétrica.

2007 Parque municipal da cidade histórica de Congonhas do Campo é atingida
por 100 toneladas de resíduos de minério de ferro que vazaram da barragem
Baixo João Pereira, da Cia Vale do Rio Doce.

2008 Vincent Cooper, funcionário de segurança da Embaixada dos EUA em La
Paz, é considerado 'persona non Grata' pelo governo boliviano por delito de
espionagem, com base em declarações do norte-americano John Alexander Van
Schaick.

2008 Aposentados do Banespa, vendido ao grupo espanhol Santander reclamam
na justiça o corte de benefícios em suas aposentadorias, e acusam que o
lucro obtido com os rendimentos dos valores não repassados a eles cobre o
valor pago pela compra do Banespa.

2008 Revista Carta Capital publica matéria em que afirma que a oposição
(PSDB + DEM + PPS) vê a questão dos cartões corporativos como oportunidade
de atingir o presidente Lula.

Paulo Henrique Amorim em seu blog, Conversa Afiada, estranha o silêncio da
imprensa com relação ao uso dos mesmos no governo Serra (SP) que foi de R$
108 milhões, contra os R$ 78 milhões do governo Federal.

2008 David Walker, diretor de auditoria e investigação do Congresso dos
EUA, renuncia por discordar das políticas do governo, o declínio dos valores
morais, e o excessivo uso de forças militares no exterior, assim como falta
de responsabilidade fiscal.

2008 Dominique Strauss-Kahn, diretor do FMI, defende o aumento dos gastos
públicos para enfrentar a crise norte-americana.

2008 John Bowe, jornalista, lança livro nos EUA em que relata casos de
trabalho escravo no país.

*Sônia Montenegro mantém o blog "Farmácia de Pensamentos" e é colaboradora do blog "Quem tem medo do Lula?"
Creative Commons License
Cite a fonte. Todo o nosso conteúdo próprio está sob a Licença Creative Commons.

Arquivo do blog

Contato

Sugestões podem ser enviadas para: quemtemmedodolula@hotmail.com
diHITT - Notícias Paperblog :Os melhores artigos dos blogs