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sábado, 9 de outubro de 2010

Crônica de fim-de-semana: O encardido: seu filho, seu neto


Enos quer porque quer banir uma das criações divinas: o namoro. Não está preocupado com o conhecimento, mas com a proibição da troca de afetos em sala de aula, algo que é, epistemologicamente, desastroso. Tiro por mim. Se o professor Nina não tivesse permitido o namoro no Colégio Estadual do Amazonas, jamais eu teria aprendido química inorgânica. Só estudei ácidos, hidróxidos e estado de oxidação, porque queria me exibir pra Marluce Saubinha, a calipígia, com quem trocava ardentes olhares em sala de aula. Isso foi no século passado.

Por José Ribamar Bessa Freire (*)


Segundo mister Kabokinho, a criação do mundo foi assim. No primeiro dia, Deus criou o céu, o sol, a lua e as estrelas. No segundo, a noite, o dia e a aurora. No terceiro, a terra, as águas e a cachaça. No quarto, as plantas e as frutas, incluindo o cupuaçu e a pimenta murupi, com seu cheiro, sabor e ardência. No quinto, os animais aéreos, terrestres e aquáticos, entre eles o pirarucu e o tambaqui. No sexto, o homem, a mulher – ah, a mulher! - o namoro, o carnaval e o futebol. Quando Deus já ia gozar, no sétimo dia, o merecido repouso, sentiu uma profunda sensação de incompletude. Queixou-se:
- O que é que está faltando ainda para o mundo ficar perfeito, meu Deus do céu?  
Viu que, sem querer, tinha invocado a si próprio, esquecendo que ELE é que era Deus. Foi aí que, assumindo plenamente o milagre da criação, descobriu o que faltava para a perfeição do mundo: o professor universitário. “Faça-se o professor universitário” - disse. E o professor universitário foi feito. Só então, satisfeito, Deus descansou.
Bastou que Ele dormisse para que o Diabo, que tudo observara, entrasse em ação, disposto a anular a obra divina e a caprichar na imperfeição do mundo. Aproveitando o cochilo do supremo arquiteto do universo, Satanás fez uma diabrura e criou... o colega de departamento. Junto com ele, a inveja e a hemorroida. Desde então, ali onde há um professor universitário surge sempre o colega de departamento, com intriga, fofoca, futrica, baixaria e perseguição.  
Hoje, esses filhos do Capiroto ocupam universidades no mundo inteiro. Um deles atua, com um sabor local, no Departamento de Língua e Literatura Portuguesa (DLLP) da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Seu nome: José Enos Rodrigues. Ele é o Colega de Departamento da professora Sandra Campos, a quem denunciou, instaurando um processo de sindicância contra ela, que se doutorou recentemente pela UFF, título que ele não possui, o que gerou um sentimento exacerbado de inveja que, como todos sabem, é uma merda.

Namoro epistemológico
Foi esse sentimento que levou o Colega de Departamento a apontar suas armas também contra os alunos. O DLLP discutiu, em reunião de 16 de setembro, entre outros, dois temas de altíssimo interesse acadêmico: “o uso de notebooks e a formação de casal de namorado em sala de aula”. A ata da reunião registra que - abre aspas - “o professor Enos fez questão de se colocar contra tal comportamento, afirmou que os professores tem autonomia para banir tal atitude” - fecha aspas.
Enos quer porque quer banir uma das criações divinas: o namoro. Não está preocupado com o conhecimento, mas com a proibição da troca de afetos em sala de aula, algo que é, epistemologicamente, desastroso. Tiro por mim. Se o professor Nina não tivesse permitido o namoro no Colégio Estadual do Amazonas, jamais eu teria aprendido química inorgânica. Só estudei ácidos, hidróxidos e estado de oxidação, porque queria me exibir pra Marluce Saubinha, a calipígia, com quem trocava ardentes olhares em sala de aula. Isso foi no século passado.
Hoje, em pleno século XXI, a troca de olhares está proibida no curso de Língua e Literatura Portuguesa da UFAM. Olhar afetuoso, mãos dadas, ternura e carinho foram banidos pela cruzada moralista do Colega de Departamento, que nunca paquerou em sala de aula e não percebe que o namoro, além de favorecer o processo de aprendizagem, produz energia e entusiasmo pela vida, contribuindo para o equilíbrio emocional e a formação da personalidade.
Um professor é um educador responsável pela formação integral de seus jovens alunos e não um delegado de polícia que vigia e fiscaliza. É inacreditável que se gaste horas discutindo fofoquinhas como personagens de telenovela. Que diabo de curso é esse cujo coordenador reprime algo saudável e benéfico ao coração e ao sistema nervoso? Por que os demais cursos não têm esse problema? Além disso, por acaso, a reitora assinou alguma portaria proibindo o namoro? Ou o uso de notebook?
A futrica
Na ata da mesma reunião se defende a proibição também do uso de notebooks porque – abre aspas - “muitos alunos atrapalham as aulas com o uso desses aparelhos” – fecha aspas. Ora bolas, então por que o professor não incorpora logo o notebook ao processo de aprendizagem? Que tipo de aula é essa? Será que é o notebook que atrapalha a aula, ou é o tipo de aula dada que está atrapalhando o uso do notebook?
O que é, afinal, que estão tentando ensinar aos nossos alunos? Futrica. É. É isso mesmo: futrica. Olhem o que aconteceu: sem notebook e sem namoro, os alunos passaram a fazer aquilo que Enos com o exemplo lhes ensinou: brigar entre si. A futrica se generalizou tanto pelo corpo discente, que se instaurou um clima assustador de “intrigas na sala”. A ata da reunião informa que “alunos querem assistir aulas nas outras turmas por estarem em conflitos com os colegas das turmas de origem”.
O pau está comendo entre os alunos do curso, a brigalhada corre solta, prejudicando as aulas. Enfim, os enos se reproduziram em senos e cosenos. Inventaram aquilo que nem o diabo ousou criar: o Coleguinha Discente, que vem a ser filho do Colega de Departamento e, portanto, neto do Encardido. Isso tudo prova que quem namora, não agride colegas.
Vejam o mau exemplo. O ponto central da reunião foi a “instauração de processo de sindicância contra a professora Sandra Campos”, para saber se o doutorado dela foi em Letras ou em Linguística. A ata registra o disse-me-disse: Enos disse que a Sandra disse que sua orientadora disse que o doutorado dela era em Linguística, quando o coordenador do curso da UFF disse que o doutorado é em Letras, “o que para o professor José Enos configura-se como falsidade ideológica, já que são áreas diferentes”.
Valei-me minha Santa Etelvina! Ele sequer sabe distinguir os níveis das áreas do conhecimento e ignora que uma mesma especialidade pode ser enquadrada em diferentes grandes áreas, áreas e subáreas. Considera a simples menção delas como irregularidade e desenha o seu grandioso programa de luta acadêmica, planejando o que fará nos próximos três anos, quando, então, se aposenta:
Diante dos fatos – diz a ata - o professor Enos enfatizou que enquanto for decano e coordenador do curso não vai deixar passar o que tanto o incomoda”. Ele jurou que vai dedicar “os dois anos e três meses que lhe restam na coordenação” na “luta para apurar tais irregularidades, pois não há como admitir esse desvio de comportamento”.
O bulhufismo
O que fazer diante do furor bélico, policialesco e ensandecido de um colega de departamento? Sandra fugiu desse inferno doentio e pediu transferência para o Departamento de Comunicação que a aceitou de braços abertos. Seu ex-Colega de Departamento passou a dedicar suas energias e sua – digamos assim – inteligência para apurar as “irregularidades”. Aí, né, sobrou pra mim. O gostosão aqui, que fez parte da banca de doutorado da Sandra, entrou nessa história como Pilatos entrou no Credo: de gaiato. Diz a ata:
“O professor José Enos afirmou que irá também questionar junto a CAPES a participação do professor Ribamar Bessa na banca examinadora de doutoramento da referida professor uma vez que Bessa confessou publicamente que não entende “bulhufas” de fonética e fonologia”.
Por que “questionar junto a CAPES”, quando o fórum mais apropriado para assunto tão grave e transcendental – o bulhufismo em fonética - é uma CPI no Congresso Nacional ou quiçá a Assembleia Geral da ONU?
Repito aqui o que escrevi: “não entendo bulhufas de fonética”, o que traduzido do discurso jornalístico para a linguagem acadêmica significa: “esse não é meu campo de especialização”. Mas não foi “confissão”, foi uma declaração que está lá pra quem quiser ler, no texto intitulado “Uma reitora para a UFAM”, seguido de outra frase esclarecedora, omitida por Enos, que indica qual é o meu campo e qual foi minha função na banca.
Se Enos disser de mim o que eu digo de mim, eu o processo por calúnia, por ser um leitor raso, que acredita piamente, ao pé da letra, naquilo que está impresso. Ele prefere pensar que alguém é capaz de caluniar a si mesmo do que entender que o processo de leitura é a produção de significados, que são múltiplos, sobretudo se o texto contém ironia, sarcasmo, humor, duplo sentido.
Entender a acidez dos comentários requer um gesto inteligente do leitor. Quem não desenvolve a prática da leitura – parece ser o caso de Enos - lê apenas o que está escrito, só a linha e olhe lá! Bom leitor é quem consegue ler o não escrito, a entrelinha, exercitando a capacidade de uma leitura crítica, meditada, descobrindo os vários sentidos de interpretação como propõe o linguista Oswald Ducrot. Ler ironia requer sagacidade para ponderar sobre o exagero proposital do autor. Mas isso é pedir demais para um colega de departamento.
Um professor de verdade, que não é “colega de departamento”, Mateus Coimbra, presente na reunião, bem informado, explicou na hora e foi registrado em ata que o papaizinho aqui “hoje é professor da UERJ, fez pós-graduação em Letras e Literatura, sua tese de doutorado transformou-se em livro chamado Rio Babel, na realidade, é um tratado social da Língua Geral, do Nheengatu”. O que seria um esclarecimento suficiente para um professor universitário não satisfaz um “colega de departamento”, que é insaciável e blindado contra qualquer tipo de argumento.
PS. - Dois recados: 1) Enos, meu bom Enos, não seja tão amargo assim. Arrepende-te de teus pecados, renuncia a Satanás, a suas pompas e a suas obras. Apaga as velas que acendeste para Santa Etelvina e te ocupa com questões mais criativas. Vai estudar, Enos! Ah, e deixa os meninos e as meninas namorarem. 2) Recado para os alunos e alunas de Letras (ou será Linguística?): em vez de brigar, namorem, que é muito bom. Escolham o lugar apropriado. E se possível, longe dos olhos dos enos, usem o notebook para enviar mensagens ao amado e à amada.

*José Ribamar Bessa Freire é antropólogo, natural de Manaus e assina no “Diário do Amazonas” coluna semanal tida como uma das mais lidas da região norte. Reside no Rio de Janeiro há mais de 20 anos e é professor da UERJ, onde coordena o programa “Pró-Índio”. Mantém o blogTaqui pra ti e é colaborador do blog “Quem tem medo do Lula?”.

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